Artigos do
Grupo Espírita Miguel Arcanjo
www.gema-rj.org

Artigos

Imprimir | Voltar

Dor ou amor?


Só quem o sabe é Deus, o magistral escultor e Criador da vida, que, com
sua sabedoria suprema, habilmente faz uso do cinzel, desbastando esse
mármore bruto.

Se, como nos exortou Jesus, tivermos “olhos de ver” e “ouvidos de ouvir” (Mateus, 13:16), estaremos aptos a compreender, mais e mais, o sentido de nossas vidas e o objetivo das múltiplas existências no corpofísico.

Em O Livro dos Espíritos está bem claro o objetivo da encarnação:

Deus lhes impõe a encarnação com o fim de fazê-los chegarà perfeição. Para uns, é expiação; para outros, missão. Mas, para alcançarem essa perfeição, têm que sofrer todas as vicissitudes da existência corporal: nissoé que está a expiação. Visa ainda outro fim a encarnação: o de pôr o Espírito em condições de suportar a parte que lhe toca na obra da criação. Para executá-la é que, em cada mundo, toma o Espírito um instrumento, de harmonia com a matéria essencial desse mundo, a fim de aí cumprir, daquele ponto de vista, as ordens de Deus. É assim que, concorrendo para a obra geral, ele próprio se adianta. (Op. cit., q. 132.)

Cada mergulho na carne nos proporciona aprendizados, visando a nossa melhoria, o que naturalmente acarreta a nossa caminhada na senda do progresso. Contudo, esse aprendizado – que deveria dar-se através do cumprimento das leis divinas – devido às sombras que ainda trazemos, exige-nos métodos pedagógicos mais marcantes, a fim de que nós, alunos não raro imersos no mar da rebeldia e do acomodamento, despertemos para a nossa própria realidade.

Desse modo, a dor nasce do desequilíbrio que insensatamente ainda vivenciamos. Ela surge como elemento de estimulação ao esforço de percepção do roteiro que deve ser seguido pelos viajores da Terra, que somos nós. Entretanto, é importante ressaltar que, quando a Doutrina Espírita se refere à dor, em hipótese alguma faz a apologia do sofrimento na ascensão humana. Desde épocas remotas, pessoas há que seguem o ascetismo, ou asceticismo (palavra derivada do grego askesis, que significa “prática”, “treinamento” ou “exercício”). É uma filosofia de vida na qual se propõe a austeridade, com o refreamento dos prazeres mundanos; os ascetas praticavam um estilo de vida rígido, até pregando o desprezo ao corpo e às sensações físicas e acreditando que, automortificando-se e participando de uma severa renúncia ao prazer, estariam adquirindo virtudes e, dessa maneira, ascendendo intelectuale espiritualmente.

Essa ideia de alguma forma se projeta até nossos dias, quando ainda nos deparamos com tantos joelhos macerados por postura repetida de genuflexão, com tantas mãos exaustas de se manterem em posição estática, determinada para orar, ou tantos corpos ainda voluntariamente martirizados por açoites e cilícios em determinados ritos religiosos oufolclórico-religiosos.

Encontramos, ademais, o conceitoequivocado da dor como “castigo de Deus”, esse Pai amantíssimo,soberanamente justo ebom, que criou suas leis roteirizandoo Bem, leis essas que nós,impensadamente, infringimostantas e tantas vezes...

Recordemos novamente O Livro dos Espíritos, quando Kardec indaga dos benfeitores espirituais o que se deve entender por lei natural, e eles nos asseveram que:

A lei natural é a lei de Deus. É a única verdadeira para a felicidade do homem. Indica-lhe o que deve fazer ou deixar de fazer e ele só é infeliz quando dela se afasta. (Op. cit., q. 614.)

O Espiritismo exalta o destino de aperfeiçoamento do homem e consequente felicidade. Enaltece a pureza obtida através do acolhimento definitivo das virtudes no âmago do coração e da mente. Esclarece que nosso sofrimento tem o tamanho de nossos erros, sofrimento esse carinhosamente amenizado pela misericórdia divina. Porém, reconhecendo a inércia e a teimosia em que ainda nos encontramos, envoltos em negativismo ou “dormindo como mortos” (Efésios, 5:14), afirma e elucida que a dor ainda é o meio seguro de impulsionar o avanço do Espírito imperfeito...

Ao sofrer, ele desperta! Desperta para a realidade de sua destinação: o Bem! Compreende, então, que o mal é estado transitório, nos dois planos da vida. Assim, em sofrendo, consegue reconhecer seus companheiros de jornada como irmãos. Consegue entender o verdadeiro sentido do doce convite de Jesus, quando nos invita, de braços abertos, a irmos até Ele e nele nos apoiarmos:

Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para as vossas almas. Porque o meu jugoé suave e o meu fardoé leve. (Mateus, 11:28-30.)


E, tomando sobre si o jugo do Cristo, que é suave, estará apto a suportar o peso do seu fardo, que será leve com oMestre ao lado...

Atentemos à seguinte comparação: bloco de mármore, frio, sem formas apuradas, distante de tudo que possa representar movimento, crescimento, progresso... Assim parece,ao menos!

Mas, lá dentro, em sua essência, palpita a luz que um dia extravasará limitações grosseiras, e irá, também, embelezar o Universo, participando, como estrela, de belas constelaçõesespirituais!...

Só quem o sabe é Deus, o magistral escultor e Criador da vida, que, com sua sabedoria suprema, habilmente faz uso do cinzel, desbastando esse mármore bruto. Com total maestria, conhecendo os pontos fracos do material a ser trabalhado, aplica-lhe golpes aparentemente duros, mas que retiram crostas e lâminas prejudiciais à nova e definitivaforma!

A cada golpe, a dor gerandoaprendizagem...

A cada dificuldade, mais carinho ao aplicar a correção educativa para a obtenção do resultadoalmejado...

Então, com o passar dos evos, na roda bendita das reencarnações, o mármore – antes disforme – sob a visão misericordiosa do Pai, vai se transformando, adquirindo paulatinamente a figura da arte verdadeira, onde a essência se expande rumo ao destino do ser que, com fé e trabalho, sedireciona para a angelitude!

Louvemos, pois, irmãos, o nosso celeste escultor, Senhor da Vida, e louvemos também a capacidade de cada um de nós de, ante os golpes do mágico cinzel, irmos nos educando e assimilando a nossa responsabilidade ante o Pai, ante nossos irmãos, ante nós mesmos e, portanto, ante a Vida emabundância a que se referiu Jesus!... (João, 10:10-11.)

Que o Mestre Amado Jesus, sob cuja égide atuamos e aprendemos aqui na Terra, siga a nos acompanhar em nossos trajetos de progresso, envolvendo-nos em seu amor! O Espiritismo, o Consolador Prometido, executa e realiza as promessas do Cristo, trazendo a luz para o recado da dor, explicando a todos como recebê-la, tratá-la e ultrapassá-la, resignados na fé e atuantes no “bom combate” de ações libertadoras, que alçarão aquele que padeceao alívio definitivo do sofrimento.

Que possamos todos nós, fervorosamente agradecer ao Pai os esclarecimentos já recebidos, e confiar nele, em Jesus, e em seus Embaixadores de Luz,direcionando-nos com decisãopara a felicidade maior do Amor!

 

Ivone Molinaro Ghiggino
Revista Reformador - Setembro de 2012
Publicado em 09/11/2014